Todos os dias, chegam centenas de e-mails de profissionais do Brasil inteiro ao Conselho Nacional de Técnicos em Radiologia (CONTER). Essas mensagens trazem denúncias, dúvidas, questionamentos, reclamações, sugestões e elogios que, sem dúvida, determinam as frentes de trabalho e ações da equipe.
Notavelmente, o assunto mais abordado pelos profissionais é o piso salarial da categoria. Não há estimativas oficiais, mas é grande o número de trabalhadores que reclamam do recebimento de remunerações abaixo do que determina a decisão liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 151. Diante do quadro, o CONTER publica oficialmente a sua interpretação sobre o assunto.
Pois bem, até o dia 5 de maio de 2011, o piso salarial nacional dos profissionais das técnicas radiológicas caminhava junto com o salário mínimo. A cada reajuste anunciado pela Presidência da República, automaticamente, os rendimentos da categoria eram atualizados.
Isso acontecia por força do Artigo 16 da Lei n.º 7.394/85, que diz:
O salário mínimo dos profissionais que executam as técnicas definidas no Art. 1º desta Lei será equivalente a 2 (dois) salários mínimos profissionais da região, incidindo sobre esses vencimentos 40% (quarenta por cento) de risco de vida e insalubridade.
Entretanto, desde o dia 6 de maio de 2011, a lógica desse cálculo mudou, por conta da publicação do acórdão da decisão liminar proferida pelo STF no dia 2 de fevereiro de 2011, no julgamento da medida cautelar interposta pela Confederação Nacional de Saúde (CNS) na ADPF 151. Por maioria, a Corte decidiu que os salários profissionais não mais seriam reajustados de acordo com o salário mínimo.
Para evitar o estado de anomia (ausência de lei disciplinando a matéria) e garantir a consecução dos direitos da classe, os ministros do STF decidiram que o salário dos profissionais das técnicas radiológicas seria convertido em valor monetário e, partir de então, sofreria reajuste anual de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA/IBGE).
À época da publicação do acórdão da decisão liminar, o salário mínimo nacional era de R$ 545,00. Portanto, pode-se concluir que o piso salarial dos profissionais das técnicas radiológicas foi fixado em R$ 1.526,00 (2 salários mínimos + 40% sobre este valor). A partir de então, o reajuste salarial passou a ocorrer anualmente, sendo corrigido pelo IPCA do ano imediatamente anterior, na data de publicação da decisão liminar do STF.
De acordo com o relator da ADPF 151, o ministro Joaquim Barbosa, este regramento valerá até o advento de nova lei federal que discipline o salário profissional mínimo da categoria, convenção ou acordo coletivo que o defina ou, ainda, de lei estadual amparada na Lei Complementar nº 103/2000, que autoriza os estados a instituírem o piso salarial a que se refere o inciso V do artigo 7º da Constituição Federal (“piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho”), quando não há lei federal específica a respeito.
A presidenta do CONTER Valdelice Teodoro reitera que essa base de cálculo somente se aplica aos casos em que não houver convenção coletiva. “Nos estados em que os trabalhadores entrarem em acordo com a classe patronal para a definição dos salários, fica valendo o que for acertado entre empregados e empregadores. Todavia, nas regiões em que os profissionais não contam com esse tipo de representação, ficam valendo as regras automáticas de reajuste determinadas pelo STF”.
Evolução dos salários dos profissionais das técnicas radiológicas
Como se pode observar abaixo, até 2011, o reajuste dos salários profissionais seguia o mesmo índice de reajuste do salário mínimo. Todavia, a partir de 2012, exatamente um ano após a decisão liminar do STF na ADPF 151, o reajuste passou a seguir o INPC que, em 2011 e 2012 foi, respectivamente, de 6,5% e 5,84%.
O caso
Na petição inicial da ADPF 151, a CNS alega que o alto custo dos salários dos profissionais das técnicas radiológicas estaria inviabilizando os serviços de diagnóstico por imagem. Com essa justificativa, a instituição pediu a revogação do Artigo 16 da Lei n.º 7.394/85, sob a alegação de que a indexação do reajuste de salários profissionais ao salário mínimo seria inconstitucional.
Entretanto, o assunto remete a uma discussão mais proeminente. O argumento para o início desse processo foi a alegação da CNS de que os salários estavam altos demais, quando, na verdade, o que existe é um cenário de má remuneração generalizada.
Para os conselheiros do Sistema CONTER/CRTRs, antes de tomar uma decisão final neste processo, o STF deve fazer uma ampla consulta às bases e ao mercado, para analisar os rendimentos do setor, o poder econômico dos contratantes, as perspectivas de crescimento da Radiologia e analisar o fundamento da tese de cada parte envolvida. “De nada vale o advento da Radiologia no Brasil se não vier acompanhado do desenvolvimento profissional de cada uma das pessoas que a desempenham. Para cobrar qualidade dos serviços, é necessário remunerar bem o profissional, de modo a lhe permitir continuar investindo em educação e aperfeiçoamento”, defende o diretor secretário do CONTER Haroldo Félix da Silva.
Os votos
A ADPF foi protocolada em novembro de 2008. O pedido de liminar nela formulado foi colocado em julgamento no Plenário do STF em 1º de dezembro de 2010. Na oportunidade, após o relator, ministro Joaquim Barbosa, indeferir o pedido e o ministro Marco Aurélio se pronunciar pelo seu deferimento, o ministro Gilmar Mendes pediu vista.
Ao trazer, em 2 de fevereiro de 2011, a matéria de volta ao plenário, o ministro Gilmar Mendes propôs a concessão de liminar parcial, que foi aceita pela maioria dos ministros presentes à sessão. Em seu voto, ele considerou o fato de que a lei questionada (Lei 7.394/1985) já está em vigor há 26 anos. Por outro lado, teve presente a inconstitucionalidade do seu artigo 16, que vincula os salários da categoria a salário mínimo regional, extinto com a unificação nacional do salário mínimo.
Assim, para a Suprema Corte não endossar a inconstitucionalidade do dispositivo, nem prejudicar a categoria profissional, Mendes propôs a solução alternativa aceita pela maioria: o salário da categoria seria fixado em valor monetário da época da publicação do acórdão e deixava de ser vinculado ao mínimo. Daí, seria reajustado anualmente, de acordo com os critérios gerais para reajuste salarial. Essa regra valerá até o advento de nova lei federal, convenção ou acordo coletivo da categoria com seus empregadores, ou, ainda, pela fixação em lei estadual, dentro dos critérios estabelecidos pela LC 103/2000.
O ministro Joaquim Barbosa, um dos três votos vencidos, manteve sua decisão pelo indeferimento do pedido de liminar, defendendo uma consulta ampla às categorias profissional e patronal envolvidas. Segundo ele, a decisão da Suprema Corte em sede de liminar “é temerária” e atende mais aos interesses dos empregadores. Também a ministra Ellen Gracie, que acompanhou o voto do relator, manifestou sua opção pela decisão do litígio apenas no seu julgamento de mérito.
Problema nacional
Fatalmente, o desrespeito ao piso salarial não é uma exclusividade dos Auxiliares, Técnicos e Tecnólogos em Radiologia. Outras categorias profissionais também sofrem com a falta de reconhecimento, mesmo amparadas por leis e regulamentos claros e específicos.
De acordo com a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), 17 estados brasileiros não cumprem o piso salarial dos professores da rede pública, que é de apenas R$ 1.452 e foi instituído pelo próprio governo federal. Enfim, não é por falta de apelo público que essas situações se repetem com várias classes profissionais.
“Existe uma grande distância entre o que diz a lei e o que se aplica na prática, quando tratamos de salários. Tanto é ilegal por parte dos contratantes remunerar abaixo do piso, quanto incorre em infração ética do profissional aceitar salários abaixo do convencionado.
Por outro lado, temos consciência de que o mercado oferece rendimentos abaixo do que determina a lei e os trabalhadores, por questões sociais e econômicas, são obrigado a se submeter a condições inadequadas de trabalho”, lamenta a presidenta do CONTER Valdelice Teodoro.
Na opinião do assessor jurídico do CONTER, doutor Antônio Cesar Cavalcanti Junior, é necessário o empenho e esclarecimento de todos os Conselhos Regionais de Técnicos em Radiologia (CRTRs) e sindicatos da categoria, para disseminar as informações corretas e cobrar dos empregadores a aplicação dos pisos e eventuais reajustes salariais.
“É responsabilidade das organizações sindicais auxiliar os profissionais no que se refere às demandas salariais. O cumprimento do piso nacional é um direito social e deve ser cobrado dos empregadores pelas entidades representativas. Contudo, em casos de claro desrespeito ao profissional, tanto conselhos como sindicatos têm a obrigação de se unir e ajuizar os procedimentos necessários para garantir o cumprimento da decisão do STF. Vale pontuar que o Sistema CONTER/CRTRs não é responsável por demandas trabalhistas, responde tão somente pela inscrição, normatização e fiscalização da atividade profissional. Entretanto, a autarquia, como órgão regulamentador, pode contribuir na defesa dos direitos sociais e coletivos”, finaliza o doutor Antônio Cesar.
Perdas significativas
Desde que as regras para o reajuste salarial dos profissionais das técnicas radiológicas mudaram, é possível verificar uma constante perda do poder aquisitivo da categoria. Enquanto os índices de reajuste do salário mínimo foram de 12,37% em 2012 e 8,25%, em 1º de janeiro de 2013, os índices do INPC foram de 6,5% e 5,84%, respectivamente.
Para o diretor financeiro do CONTER Abelardo Raimundo de Souza, o julgamento parcial da ADPF 151 encontrou terreno fértil para que fosse semeada a desinformação e o resultado é a desvalorização profissional permanente da categoria, sobretudo nas regiões em que as representações sindicais não correspondem à expectativa da classe.
“Os profissionais precisam se dedicar mais à vivência sindical, pois hoje temos diversas representações entregues a pessoas inoperantes, que são um peso para a categoria. O tempo do ostracismo acabou, a modernidade bate à porta, devemos cobrar ações práticas dos nossos dirigentes de classe. Sem demora, os profissionais precisam se unir para nos livrar de tudo o que atrasa e nos faz andar para trás”, defende o diretor.
Por ser provisória, essa decisão do STF exige acompanhamento. A resolução final do caso depende do julgamento do mérito da ação, mas não há prazo para que isso ocorra.
FONTE: CONTER
08/03/13